domingo, 30 de novembro de 2008

Armazém apresenta peça de estrutura fragmentada sobre a memória

Arliete Rocha, Jornal do Brasil
RIO - Deu para sentir saudades. Já fazia um tempinho que a Armazém Companhia de Teatro não investia na dramaturgia original que marcou sua trajetória. Veio a vontade de mostrar o olhar do grupo sobre os grandes clássicos teatrais – e assim chegaram aos palcos Toda nudez será castigada (2005), de Nelson Rodrigues, e Mãe coragem e seus filhos (2007), de Bertolt Brecht.
Agora, soprando 21 velinhas, a trupe de Londrina, que há uma década trocou a cidade paranaense pelo Rio, volta aos textos próprios – sempre líricos e inventivos. A inveja dos anjos, que estréia nesta sexta, no teatro (agora totalmente reformado) que o grupo mantém na Fundição Progresso, também marca a retomada da parceria de Paulo de Moraes com o poeta Maurício Arruda Mendonça, iniciada com o elogiado Alice através do espelho, em 1999, sucesso de crítica e de público.
– Apesar de o Maurício continuar em Londrina, a nossa parceria se dá de uma forma natural. Ele é poeta, tem a beleza da palavra. A minha parte é mais voltada para o desenvolvimento temático e a concretização da ação – explica Moraes, também responsável pela direção e cenografia do espetáculo.
Quem for assistir a Inveja dos anjos vai se deparar com a memória tratada de uma forma delicada, simbolizada por três histórias com ações distintas, mas que se entrecruzam através da amizade que une seus protagonistas.
Os trilhos de uma estrada de ferro, espalhados por todo o cenário, marcam o encontro dos personagens.
– Antes de escrever o texto eu já sabia qual era o espaço que iria usar como cenário. Os trilhos de um trem são uma imagem forte para simbolizar chegadas e partidas e servem como entroncamento das relações cruzadas que marcam o espetáculo – diz o diretor, que, ano passado, encenou Pequenos milagres, parceria com o Grupo Galpão, de Minas Gerais.
O ator Marcelo Guerra vive o carteiro Eleazar, o mensageiro que transita e interfere no rumo das histórias – ele tem por hábito abrir as cartas, ler e determinar em que momento devem ser entregues, dependendo se trazem boas ou más notícias.
Na pequena comunidade, dominada pelos trilhos do trem, aparecem os outros personagens. A menina Natália (Verônica Rocha), aos 9 anos, convive com o peso de uma mãe dependente química. Encara a vida como pode, ora de maneira adulta, ora recorrendo à fantasia para contornar a dura realidade.
A imensa dor, ainda que em curta existência, a leva a procurar o pai, que jamais conhecera. A vida de Tomás (Ricardo Martins), dono de um sebo e escritor eternamente em crise, ganha novo significado a partir desse encontro.
Amiga de Tomás, Luiza (Simone Mazzer) é uma confeiteira que encara uma difícil relação com a mãe, Branca (Simone Vianna), uma velha senhora prisioneira do passado e que depende de cuidados.
A razão da angústia e revolta de Luiza é revelada por um segredo. Noutra ponta, aparece Cecília (Patrícia Selonk), uma garçonete que amarga a perda de Rocco (Thales Coutinho). Mágico por profissão, bon vivant e meio trambiqueiro, saiu para comprar cerveja e retornou 15 anos depois, disposto a recuperar o amor de uma descrente Cecília.
– O que fica evidente na narrativa é a impossibilidade de apagar a memória. O passado começa a aparecer para cada personagem, seja com a revelação de um segredo ou de um fato que até então se desconhecia ou com o retorno inesperado de alguém – analisa o diretor.
A estrutura narrativa fragmentada que marca a dramaturgia do Armazém tem uma lógica interna que absorve o espectador. A pesquisa das obras de Gabriel García Márquez e do autor americano Paul Auster também aparece na montagem.
– Em Cem anos de solidão as relações familiares arcaicas são muito fortes. Já o Paul Auster lida muito bem com as relações afetivas contemporâneas – avalia.
Da obra do autor colombiano, o realismo fantástico é um forte elemento no trabalho de experimentação desenvolvido pelo grupo. A menina Natália recorre a fábulas como Chapeuzinho Vermelho e Alice no País das Maravilhas para amenizar sua dura realidade.
A teatralidade do corpo, um dos pontos fortes na preparação dos atores do Armazém, ganha destaque na construção da personagem Branca. Nos seus devaneios, a velha senhora é constantemente acompanhada por uma espécie de espantalho, caracterizado pela metade de um paletó envolto numa parte do corpo da atriz. Com ele, dança e troca carícias, revelando seu mundo fantasioso e ausente da realidade.
Diferentemente do espetáculo Da arte de subir em telhados (2001), que trabalhava com planos verticais, Inveja dos anjos é tratado num plano essencialmente horizontal.
Com o teatro totalmente remodelado, o espaço cênico reproduz o trecho de uma estrada de ferro que corta a boca de cena de ponta a ponta em uma extensão de 20 metros.
A platéia fica bem próxima do campo de ação, em quatro fileiras. A visão horizontal estimula o público a fazer seus próprios enquadramentos, acompanhando a movimentação dos atores como num filme, tarefa facilitada pela iluminação de Maneco Quinderé.
As vigas de aço e os dormentes que percorrem o chão também sobem para um plano aéreo, uma espécie de variante para onde os personagens se deslocam, revelando seus altos e baixos existenciais.
Serviço
Fundição Progresso – Espaço Armazém – Rua dos Arcos, 24, Lapa (2210-2190). Cap.: 126 pessoas. 5ª a dom., às 20h. R$ 30. Neste domingo, não haverá sessão. Estudantes e idosos pagam meia. 14 anos. Duração: 1h45. Até 21 de dezembro.

Um direito ameaçado: 'não' à restrição da meia-entrada

O direito à meia-entrada para estudantes em eventos culturais existe no Brasil desde a década de 40. Serve para garantir a formação plena aos jovens que aprendem não só quando estão em sala de aula, mas também indo a teatros, cinemas, museus. O projeto de lei 188/ 07 que tramita no Senado ameaça esse direito histórico, legítimo e conquistado com muita luta por diversas gerações do movimento estudantil.

Por Lúcia Stumpf*, na Folha de S.Paulo
A UNE, nos seus 70 anos de história, sempre teve uma atuação marcante no desenvolvimento da cultura nacional. Na década de 60, o Centro Popular de Cultura (CPC) forjou uma geração de artistas que até hoje se destaca no cenário brasileiro.

Hoje, o Centro Universitário de Cultura e Arte da UNE, o Cuca, além de formar jovens artistas, promove o diálogo entre a cultura erudita e a popular. A Bienal de Arte da UNE, que em janeiro de 2009 chegará à 6ª edição, é o maior festival artístico de juventude da América Latina.

Além de fomentar, a UNE defende a democratização do acesso à cultura, formando cidadãos e platéias conscientes. O direito à meia-entrada é o principal instrumento que os estudantes têm para conseguir fazer parte do cenário artístico do país.

É fato que, hoje, esse direito já não mais existe na prática. Desde a edição da medida provisória 2.208/01, de autoria do então ministro da Educação Paulo Renato Souza, assistimos à desregulamentação da meia-entrada.

A medida provisória abriu espaço para que oportunistas de plantão montassem um verdadeiro mercado de falsas carteiras de estudante, emitidas agora por qualquer instituição ou estabelecimento, dando origem às fraudes. Essa proliferação descontrolada permitiu que estabelecimentos artísticos elevassem o preço dos ingressos, fazendo com que, na prática, o preço que pagamos como se metade fosse seja o valor integral.

Os cidadãos de bem, que não se corrompem mesmo com a facilidade de obter um documento falso, são submetidos a preços exorbitantes e incompatíveis com a renda média da população.

São os estudantes os maiores interessados em uma nova e urgente regulamentação da meia-entrada. Precisamos revogar a medida provisória 2.208/01 e estabelecer um novo marco regulatório capaz de atacar o verdadeiro problema: as falsas carteiras estudantis. Defendemos a criação de um documento único, padronizado nacionalmente, que possua mecanismos capazes de coibir a falsificação. Defendemos ainda a criação de um conselho nacional fiscalizador capaz de validar as carteiras emitidas pelas entidades estruturadas e reconhecidas nacionalmente.

Porém, não podemos aceitar calados a tentativa de limitar o acesso dos estudantes ao benefício da meia-entrada. A essência do projeto analisado hoje no Senado é a restrição do direito à meia-entrada para os estudantes, e não a resolução dos reais problemas que enfrentamos.

A limitação do acesso à meia-entrada, a partir da criação de um limite de 40% de ingressos — a serem disputados entre estudantes e idosos —, sem a regulamentação da emissão da carteira de identificação estudantil atenta apenas à questão financeira dos empresários artísticos.

O Congresso Nacional deve se debruçar sobre o tema para solucionar o problema enfrentado pelos estudantes que já não conseguem mais acessar o direito à meia-entrada. O rigor da lei deve estar voltado à aplicação do benefício da meia-entrada, e não à restrição desse direito.

A juventude brasileira é a parcela da população que mais sofre as conseqüências das mazelas sociais. São os jovens as maiores vítimas da violência, do desemprego e da falta de perspectivas. Retirar dos estudantes o direito de acesso à cultura será um duro golpe numa geração já bastante sofrida. Não podemos pagar o preço da ganância de uns poucos empresários.

Chamamos a sociedade e o Congresso Nacional para olhar o problema como um todo e a partir da perspectiva dos verdadeiros atingidos pela desregulamentação do direito à meia-entrada: os estudantes. Queremos, sim, uma nova lei capaz de ampliar nosso direito, mas nunca restringi-lo. Abaixo a medida provisória 2.208/01! Pela regulamentação da emissão de carteiras sem restrição do direito!

* Lúcia Stumpf é presidente da UNE

sábado, 29 de novembro de 2008

Pons: o drama, a comédia ou a farsa do cinema brasileiro

Fazer um filme não é mais privilégio de projetos milionários. Levá-lo ao seu público ainda é. O Brasil hoje se orgulha da façanha de ter retomado a produção do seu cinema, mas não sabe o que fazer com seus filmes. Em termos de tecnologia, aprendemos com os americanos. Em termos de consumo interno dos nossos próprios filmes, parecemos um país de fundo de quintal.

Por Paulo Pons*
O que ainda não se decidiu é o que se quer para o nosso cinema, nem se esse “cinema retomado” quer dizer apenas filmes produzidos, já que em mercados mais organizados cinema quer dizer filmes realizados e distribuídos e exibidos. Antes de se estabelecer qualquer indústria, sabe-se que é imprescindível garantir sua infra-estrutura (no caso do cinema, salas de exibição) e mercado consumidor.

Não temos nada disso, de modo que não dá pra se dizer que existe no Brasil um cinema nacional se apenas os produtores, pré-remunerados por seus filmes de milhões financiados a fundo perdido, recebem os privilégios do seu mercado, enquanto a outra ponta, o público — que num país de incentivos fiscais é quem paga a conta — não vê o resultado do seu próprio mecenato. Eu mesmo sou um produtor e sei que se não mudarmos com urgência esse panorama de esbanjamento de recursos e fracassos de resultados, em muito pouco tempo não nos restará cinema nacional para fazer ou exibir.

Para que cheguemos a este fim trágico, basta que na renovação dos mecanismos de isenção da Lei do Audiovisual, programada para 2010, alguém veja em tudo isso uma farsa, e o processo não seja renovado. Ou que, em caso de manutenção dos mecanismos, as alterações urgentes e necessárias não sejam feitas, e tudo continue deste mal para pior.

Lemos muita gente protestando nos jornais sem apresentar, em contrapartida, propostas ou projetos de mudança. Não é, de fato, o nosso caso. Há poucos meses, provamos que é possível realizar um filme de qualidade técnica e artística com muito pouco dinheiro. Vingança, nosso primeiro longa-metragem, custou R$ 80 mil e foi exibido pela primeira vez já em competição em um dos principais eventos de cinema do país, o Festival de Gramado.

Sua segunda exibição pública aconteceu dois meses depois, na seleção oficial de outra grande competição, o Festival do Rio. Em ambas as disputas, concorremos de igual para igual com filmes de mais de R$ 3 milhões. A sonhada democratização do cinema nacional parecia ter finalmente se tornado uma realidade. E foi co m este espírito, misto de júbilo e fé no cinema nacional, que estreamos Vingança em circuito comercial na última sexta-feira, dia 21.

Mas, apenas quatro dias depois, na segunda-feira, foi decidida nossa retirada de nove das 12 salas em que estreamos. Nas três salas em que ainda sobrevivemos, nossa presença foi reduzida a uma ou duas sessões diárias, em horários parecidos com o do Unibanco Arteplex, único cinema em que permanecemos no Rio de Janeiro, na sessão das 13 horas.

Ou seja, se a realização de Vingança ajuda a vencer o paradigma do cinema milionário como único possível, a simples tentativa de colocá-lo à disposição do público através do circuito comercial brasileiro comprova a velha e perniciosa tese de que, para serem exibidos, alguns filmes precisam se tornar fenômenos de receita já nos três dias de sua estréia. Ou esses filmes “bombam” comercialmente, ou vão para o lixo, não importa seu valor cultural, seu potencial artístico ou de entretenimento, nem o cinema que eles representam para seu país.

No dia do lançamento de Vingança, O Globo e o Jornal do Brasil escreveram sobre o filme coisas como “um alento para o cinema brasileiro” e “suspense em estado puro”, e a revista Veja, que chegou às bancas no dia seguinte apontando Vingança como um dos dez melhores filmes em cartaz no momento, publicou: “Bem contada, a trama de mistérios escrita e dirigida pelo estreante gaúcho Paulo Pons merece encontrar seu público”.

Infelizmente, é o público quem não terá muitas chances de encontrar nosso filme nas salas de cinema. Se já foi difícil transformá-lo em “fenômeno de bilheteria” (exigência que se faz a filmes como o nosso, dirigido por um estreante desconhecido e protagonizado por atores idem) nos seus três dias de estréia, o que se esperar de Vingança em sessões das 13 horas, numa única sala de cinema no Rio e em outras duas em São Paulo?

O mercado pode não ver nisso uma tragédia, mas estatística, apenas. A despeito do que essa semana acontece com o nosso filme – e do que tem acontecido de similar com muitos outros, como se sabe – o número de produções iniciadas no Brasil cresce a cada ano, assim como seus custos. A média de orçamento de um longa-metragem brasileiro alcançou este ano o valor de R$ 2,5 milhões. O público se retrai, e o preço dos ingressos ainda cresce.

Na sexta-feira em que Vingança estreou, outros 13 filmes foram lançados no país. Não há salas para todos. Ao mesmo tempo, basta justapormos esses números ao índice de participação do público de cinema junto aos filmes nacionais, que no primeiro semestre de 2008 não chegava a 8% do total, para sabermos que a coisa toda não apenas vai mal, como seu destino é certo e, agora indiscutivelmente, trágico.

Um dos nove cinemas onde estreamos e nos quais não sobrevivemos à primeira semana foi o Ponto Cine, em Guadalupe, subúrbio do Rio. O Ponto Cine é mais que um cinema, é um projeto incrível de formação de público para filmes brasileiros. Lá se projetam exclusivamente longas-metragens nacionais ao preço de R$ 6 reais a inteira e R$ 3 a meia. No último sábado estivemos em Guadalupe e conversamos com uma platéia lotada após a sessão das 10 horas da manhã.

Vingança foi muito bem no Ponto Cine, mas o cinema de sala única tem um festival programado para a próxima semana. Ao deixarmos Guadalupe, depois de um maravilhoso debate com o público e uma conversa muito interessante com o Adaílton Medeiros, fundador do projeto, perguntávamos a nós mesmos por que não existem no Brasil outros 20, 50, 100 cinemas como o Ponto Cine, cobrando ingressos por aqueles valores e localizados em regiões como aquela (subúrbios de metrópoles ou cidades de pequeno e médio porte, hoje sem salas de exibição).

Esta é a mais evidente e rápida solução para todos os problemas do cinema brasileiro. Uma sala como a do Ponto Cine pode ser construída ao custo de, no limite máximo, R$ 500 mil. Foram realizados mais de 80 longas-metragens brasileiros este ano, ao custo médio de, como já foi dito, R$ 2,5 milhões. O suficiente para se construir cinco pontocines. Dez filmes brasileiros médios, igual a 50 salas de cinema para filmes brasileiros. Não é demais sonhar sobre números tão realistas.

No Arteplex, nossa experiência foi oposta. É verdade que adoramos aquelas instalações e, da mesma forma como passamos agora a admirar o espírito empreendedor e a inteligência do Adaílton, já admirávamos as mesmas qualidades no Adhemar Oliveira, fundador do Arteplex. O complexo de cinema montado por Adhemar há dois anos e meio em Botafogo, zona sul do Rio de Janeiro, tem seis salas de cinema que oferecem os melhores suportes técnicos e de conforto para se exibir ou assistir a um filme.

Foi lá que ficamos orgulhosos de vermos o cartaz de Vingança ao lado de filmes como Vicky Cristina Barcelona, do Woody Allen, e 007 — Quantum Of Solace, do Marc Foster, exibidos em outras salas. Agora, daí a acreditar que Vingança iria se tornar, em apenas três dias de um fim de semana de feriado e com essa concorrência, o fenômeno necessário para permanecer com seus horários intocados, isso sim seria demais.

Talvez, ainda na semana anterior ao lançamento de Vingança, devêssemos ter feito um grande apelo público para que as pessoas fossem assistir ao nosso filme no seu primeiro fim de semana, como fez Murilo Salles com seu Nome Próprio. Agora é tarde para súplicas e, principalmente, para reclamações. Estamos deixando o circuito — ou, em tempo, estamos sendo deixados pelo circuito exibidor brasileiro.

O que podemos dizer a nós mesmos e, no caso desse texto, aos outros, é: lembremos dos que até há pouco tempo diziam que não era possível realizar um longa-metragem de qualidade técnica e artística com menos de alguns milhões de reais. Lembremos também que alguns ainda dizem isto, apesar de Vingança estar aí (mesmo que apenas em três salas e em horários desfavoráveis) para quem quiser ver e acreditar nesta nova verdade.

Sobre termos conseguido a façanha de realizar nosso filme como queríamos e, por outro lado, termos sido implacavelmente rejeitados pelo mercado exibidor, lembremos ainda que: se podemos mover uma montanha, podemos mover todas, cada uma a seu tempo. Realizar um filme é acreditar que um sonho pode se tornar realidade — e que, tornando-se real, faz muitos outros sonharem com a gente.

Queremos público, e para isso precisamos, com urgência, de mais salas de exibição, 50, 100, 200 salas para filmes brasileiros. Ainda há tempo, nenhum de nós pretende desistir do cinema brasileiro.

* Paulo Pons é roteirista, produtor e diretor do recém-lançado Vingança

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Ator faz 'curso intensivo' para interpretar Lula no cinema


Tay Lopes engordou seis quilos dos dez que prevê ganhar até o início do ano que vem. Entrou em uma turma do Senai em São Paulo para aprender torno mecânico, está deixando a barba crescer, vai a reuniões de sindicatos e vê vídeos sobre as greves do final dos anos 70. Treina fazer a língua presa, mas apenas vez ou outra, para não soar uma caricatura da figura que interpretará em seu segundo trabalho no cinema.
Tay Lopes, ao lado de reportagens antigas sobre Lula
Aos 29 anos, o ator recifense precisa ficar parecido com o presidente Lula até janeiro de 2009. Ele será Luiz Inácio Lula da Silva dos 18 aos 35 anos no filme Lula — O Filho do Brasil, de Fábio Barreto. Desde a seleção para o papel, Lopes vive um "intensivo" que inclui aulas de musculação, encontros com uma nutricionista e estudos sobre a vida do presidente. O ator está lendo agora o livro de Denise Paraná, que tem o mesmo título e inspira o roteiro do longa-metragem.

“A cada dificuldade, desafio, perda, ele (Lula) viveu uma transformação”, afirma o ator — que não diz se votou no presidente ("Precisa mesmo responder isso?"), mas conta que foi para a Avenida Paulista comemorar sua vitória no primeiro mandato. Antes de aparecer como o pastor Jaziel em Última Parada 174, sua única atuação fora do teatro havia sido em A Pedra do Reino, minissérie da Globo, de Luiz Fernando Carvalho.

“Eu disse: ‘Ainda vou trabalhar com esse cara’. E fui”, conta Lopes. Aos 11, ele diz, foi a mesma história: “Eu disse: ‘Vou trabalhar em teatro’. E fui”. Ao lado dele, a produtora Paula Barreto emenda: “Tá vendo? Ele tem a garra do Lula”.

"Hipopocaré"

Lopes se mudou para São Paulo em 1999, depois de ter participado de "todos os grupos amadores" de Recife, de ter interpretado um "hipopocaré" (mistura de hipopótamo e jacaré) com corpo de espuma num espetáculo e de ter feito peça até em campo de futebol (A Paixão de Cristo). Começou a trabalhar como garçom num restaurante nos Jardins que, segundo ele, recebia muitos atores e diretores de teatro. “Me capitalizei, sabe?”, diz Lopes, sobre os contatos que fez e que o levaram ao grupo paulista XPTO.

Mais tarde, depois de ter feito Última Parada 174, foi convidado por Antonio Abujamra para trabalhar em Os Possessos. Lá, ouviu do diretor: “Você está com um naturalismo que funciona bem em TV e cinema”. E confessa: “Fiquei com aquilo na cabeça. Fiz o teste para Lula e, quando soube do resultado, liguei correndo para minha mãe, minha Lindu (mãe do presidente Lula), e meu pai", conta e, em seguida, começa a chorar.

No longa-metragem, a cena do enterro de Lindu — que morreu em 1980, quando Lula estava preso — vai encerrar o filme. Usando barba importada, já que a sua foi considerada "insuficiente" pela produção, Lopes se mudou para São Paulo entrará num carro preto depois de discursar para "uma multidão" no cemitério de São Bernardo.

Com efeito de fusão, a cena que o público verá na tela em seguida é a do próprio presidente no carro, rumo ao discurso da posse — a única com imagens de arquivo e com Lula já no cargo. Para Lopes, “a preocupação é a alma do homem”. “Não dá para ser mimético, porque seria de fora para dentro”, analisa o ator. “É para ser Lula não sendo. É a minha memória e muitas coisas coincidindo.”

“Lula bebê”

Orçado em R$ 12 milhões para produção mais R$ 4 milhões para comercialização, Lula — O Filho do Brasil não buscou incentivo na Lei Rouanet — mas pretende fechar co-produções com países como Argentina, França, Itália e Estados Unidos. Além de Tay Lopes, a produção precisa de atores para viver o presidente em outras fases de sua vida, com participações menores no filme.

A pesquisa de elenco será dividida entre os estados de Pernambuco e São Paulo. O Lula bebê e o Lula de dois a três anos de idade serão procurados na pernambucana Garanhuns (terra natal de Lula). Em São Paulo, a produção pretende encontrar os atores para viver Lula criança, de cinco a sete anos, e Lula adolescente, de 12 a 15 anos.

Segundo Paula Barreto, a produtora, ainda é preciso encontrar os atores que viverão os sete irmãos do presidente que aparecem no filme. “É uma superprodução. Vamos mostrar uma das maiores migrações da história (a vinda de nordestinos para o Sudeste), inundações, greves, desabamentos.”

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Meia-entrada: PSDB aprova cota; UNE quer vetá-la no Plenário


A Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE) do Senado aprovou nesta terça-feira (25) projeto de lei do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) que regulamenta a meia-entrada com cota de 40%. “Regulamentar é bom, mas a cota é o fim da meia-entrada”, disse Ismael Cardoso, presidente da Ubes. “Perdemos uma batalha, mas não a guerra. Vamos lutar para o projeto ser votado no Plenário do Senado. Ainda temos chance de derrubar a cota”, resumiu a presidente da UNE, Lúcia Stumpf.
O destaque que pedia que a cota fosse retirada do projeto, solicitado na reunião anterior da Comissão pelo senador Inácio Arruda (PCdoB-CE), não foi suficiente para que os estudantes derrubassem a medida retrógrada nesta terça. Na votação, apenas sete dos 21 parlamentares foram favoráveis à proposta de Arruda, número insuficiente para aprovação do destaque.

Com isso, manteve-se o conteúdo do projeto com cotas, agregando ainda a absurda exigência dos empresários da compra do ingresso até 72 horas antes do início do espetáculo. Os produtores também reivindicaram um subsídio do Estado para as entradas vendidas pela metade do preço. A relatora do projeto, senadora Marisa Serrano (PSDB-MS), acatou toda a lista empresarial autorizando o Poder Executivo a ''indicar a fonte de recursos para ressarcimento dos produtores''.

Com a cota aprovada, 40% do total de ingressos em shows, teatros, cinemas, circos, museus e outros eventos culturais ou esportivos serão destinados a estudantes e pessoas com mais de 60 anos. O benefício não será cumulativo com outras promoções e convênios, e também não será aplicado ao valor dos serviços adicionais oferecidos em camarotes, áreas e cadeiras especiais.

Por ter sofrido alterações, a matéria deverá passar por um novo turno de votação na comissão antes de ser encaminhada para a Câmara dos Deputados. Se for apresentado recurso, o projeto pode ter de passar por uma votação no Plenário do Senado antes de ser encaminhado à Câmara. É aí que reside a esperança de manter vivo o direito tão arduamente conquistado pelos estudantes.

O objetivo é ampliar o debate sobre o ponto que define a cota de 40%. Com mais tempo e maior debate em Plenário, os estudantes acreditam poder reverter a medida que representa um dos maiores retrocessos entre as conquistas estudantis dos últimos anos.

O texto final ainda sugere a criação do Conselho Nacional de Fiscalização e Controle, pelo Poder Executivo. O órgão será responsável por definir as regras para emissão das carteirinhas de estudante, estabelecendo os critérios de padronização, confecção e distribuição dos documentos.

Fim da meia-entrada

''Não concordamos com o projeto como ele está, porque na materialização desta política, o direito à meia-entrada na prática será restrito. Isto porque não foi apresentado até agora um único mecanismo que garanta a transparência na venda destas cotas”, argumentou a presidente da UNE.

“A experiência nos mostra que, nos municípios onde há o sistema de cotas, elas não são asseguradas aos estudantes. Isto porque a fiscalização é impossível. O próprio setor do empresariado cultural e artístico admite que não há meios de assegurar o respeito às cotas de meia-entrada'', reafirmou Lúcia.

O argumento foi o mesmo utilizado pelo senador Arruda, que já tinha adiado a votação na última semana, ao pedir vista do relatório. Nesta terça, ao apresentar seus destaques, ele afirmou que o Senado deveria regulamentar a emissão do documento de identificação estudantil, mas não cometer ''o grande equívoco de castrar os direitos dos estudantes''.

Em um voto em separado, o senador também rejeitou a venda antecipada de meia-entrada, mas no relatório aprovado, permanece a sugestão de que os moldes desta venda antecipada sejam definidos pelo Conselho Nacional de Fiscalização e Controle.

Para Lúcia, a criação do Conselho Nacional de Fiscalização composto por empresários, estudantes e o governo, e a emissão de um documento único de identificação estudantil pela Casa da Moeda, propostas da entidade inclusas no projeto aprovado nesta terça, seriam responsáveis pela diminuição do número de estudantes que acessam a meia-entrada.

A garota “Cansei” e o Capitão Nascimento

Os estudantes enfrentaram a mobilização pesada dos empresários nesta terça, que trouxeram até atores globais para defender a cota. Nomes como Wagner Moura, Gabriela Duarte, Christiane Torloni fizeram lobby durante a discussão, tentando convencer os senadores que estavam contra as cotas.

Para os atores e atrizes, a regulamentação em conjunto com as cotas, resultará em uma queda no preço dos ingressos para os espetáculos. Este foi o argumento de Gabriela Duarte, uma das estrelas do já morto “Cansei”, ainda antes do início da reunião. Segundo ela, ninguém mais no país paga o preço cheio da entrada. ''Aí, o que acontece? Os preços ficam exorbitantes e irreais, como ocorre hoje''.

A presidente da UNE reconhece que a falsificação de carteiras de estudante inviabilizou o trabalho dos empresários culturais, que aumentaram o valor do ingresso para dar conta dessa situação. Mas acredita que a regulamentação na emissão e distribuição do documento serão suficientes para coibir as falsificações. “Já estamos tomando medidas para inibir a falsificação, assim menos pessoas terão acesso à carteira de estudante. Nesse contexto, não há porque ter cota”, defendeu Lúcia.

''Se a cota for aprovada, se as carteiras de estudantes forem emitidas pela Casa da Moeda, de forma legal, evidentemente o preço vai baixar, por uma questão de mercado até. Nós somos os mais interessados de ter o público jovem nos nossos espetáculos'', defendeu Wagner Moura, já comemorando a votação. ''A gente está feliz. Vamos tentar mobilizar os artistas para que a aprovação aconteça da forma mais rápida e tranqüila possível''.
Da redação, com agências

BIENAIS E SONHOS





Os sonhos, de que são feitos? Idéias, desejos, medos? Talvez de um elemento distinto, um tipo de molécula completamente diversa? Ninguém sabe ao certo, por enquanto. Desconfio, todavia, que os sonhos sejam feitos da mesma matéria mental que produz arte, revoluções, amor. Nesta Bienal de Arte, Ciência e Cultura, realizada na Lapa, entre os dias 20 e 23 de novembro, tentou-se, mais uma vez, encontrar a origem dos sonhos. Em vão, naturalmente. Na falta dessa resposta, outros assuntos foram discutidos: financiamento para pesquisa, arte em novas tecnologias, literatura, artes plásticas. Houve batalha de mcs, bandas de música, Djs, VJs, festas, apresentação de grupos populares, teatro, oficinas de arte, enfim, toda a sequência costumeira de atividades que os homens se engajam para não pensar nas questões primordiais da existência. A frustração, no entanto, é minorada pela constatação de que, se esta primeira Bienal de Arte do Rio, organizada pela União Estadual dos Estudantes, não contribuiu para a filosofia universal, ela trouxe estudantes de várias partes do Estado, alojou-os em bons hotéis (não em alojamentos coletivos, como se costuma fazer com estudantes), alimentou-os adequadamente, proporcionou-lhes eventos de qualidade, durante o dia, e inesqueciveis momentos de confraternização à noite. Tudo isso na antológica Lapa. Esperamos que todos tenham gostado. Cordialmente, Miguel do Rosário, editor do blog da Bienal.bienalueerj.blogspot.com

Classe artística comemora a posse de Sérgio Mamberti na Funarte



O ator, diretor, produtor e artista plástico Sérgio Mamberti foi empossado presidente da Fundação Nacional de Artes (Funarte) pelo ministro da Cultura, Juca Ferreira, em cerimônia realizada, nesta segunda-feira, 17 de novembro de 2008, no Palácio Gustavo Capanema, no Rio de Janeiro. Bastante emocionado, Mamberti apresentou, em seu discurso, as diretrizes que irão orientar as políticas públicas da Fundação pelos próximos dois anos e foi, inúmeras vezes, aplaudido de pé pela platéia. "É com sincera modéstia que aceito esta incumbência e ofereço como contribuição a experiência que acumulei ao longo de 50 anos de militância, para um projeto democrático de cultura em nosso país", disse o novo presidente.>>Mamberti ressaltou a importância de implementar mudanças para reestruturar a instituição, reafirmar sua relevância no cenário artístico e valorizar servidores e corpo gestor. "Será necessário estabelecer prioridades e contar com a colaboração do ministro Juca Ferreira, do sistema MinC, dos servidores, dos poderes executivo e legislativo, da sociedade civil e da iniciativa privada para garantir os resultados esperados".O ator afirmou ainda que pretende levar para Brasília a sede administrativa da Fundação, de modo a deixá-la mais próxima do centro de decisões do país. "Mas a Funarte continuará com forte presença no Rio, pois a cidade dividirá o expediente administrativo com Brasília", diz Mamberti, que deseja ainda criar representações da Funarte em outros estados, de forma a garantir maior acesso da população a programas e ações. Atualmente, a Fundação tem sedes no Rio de Janeiro, em São Paulo, em Minas Gerais e Brasília. Por fim, o novo presidente estabeleceu como metas fortalecer o colegiado formado pelos diretores das áreas de Artes Visuais, Artes Cênicas e Música, e agilizar a tramitação dos projetos inscritos na Lei Rouanet.Na cerimônia, o Ministro da Cultura, Juca Ferreira, explicou os motivos que o levaram a escolher Mamberti para o cargo. O novo presidente precisaria ser democrático, ter profunda compreensão da necessidade de se alargar o conceito de cultura e estar aberto ao diálogo com funcionários. "Eis que a imagem grandiosa de Mamberti me vem à cabeça", disse. "É uma emoção imensa ver o novo presidente ser recebido de maneira tão carinhosa por todos os setores que dependem da ação do ministério e da Funarte para desenvolver seu trabalho. Eu só entendo gestão pública assim: quando há intercâmbio não só de projetos, programas, recursos, bens e serviços, mas também de afetos". O desejo de todos os servidores em colaborar para a reestruturação da Funarte foi lembrado no discurso da presidente da Associação dos Servidores da Funarte (Asserte), Paula Nogueira. Ela destacou o papel da instituição como formuladora e executora das políticas públicas de cultura nas suas áreas de atuação e chamou a atenção para a importância do servidor. "Não existe política pública sem servidor público e a melhoria dos serviços prestados à coletividade passa, necessariamente, pela valorização dos agentes que prestam estes serviços", afirmou.Artistas elogiam escolha de Mamberti para a Funarte Estiveram presente na solenidade autoridades e representantes da classe artística brasileira, como Myriam Lewin, que assumirá o cargo de diretora executiva da Funarte; o secretário executivo do MinC, Alfredo Manevy; o presidente da Fundação Biblioteca Nacional, Muniz Sodré; a presidente da Fundação Theatro Municipal do Rio de Janeiro, Carla Camurati; a atriz Fernanda Montenegro; a bailarina e coreógrafa Deborah Colker; a gerente de Patrocínios da Petrobras, Eliane Costa; entre outros. O arquiteto e designer gráfico Ricardo Ohtake elogiou a escolha de Sérgio Mamberti para o cargo. "Quem foi um excelente secretário da Identidade e da Diversidade Cultural vai saber ter um diálogo extremamente aberto na Funarte. Essa grande abertura vai permitir que o debate seja amplo e irrestrito. O Serginho já demonstrou ter abertura excepcional para entender tudo o que acontece pelo Brasil", ressaltou. A atriz, produtora, roteirista e diretora de cinema Carla Camurati, presidente da Fundação Theatro Municipal, acredita que Mamberti será capaz de equilibrar a instituição. "Ele conhece muito bem teatro, está há bastante tempo no Minc, tem conhecimento do trabalho e é querido pela classe. Vai conseguir manter equilibrada essa relação com o Ministério da Cultura", disse. Na opinião do presidente da Fundação Biblioteca Nacional, Muniz Sodré, escritor, pesquisador e doutor em Comunicação, Mamberti "vai conseguir levantar a Funarte". "Ele é um articulador, conhece bem a classe teatral e revelou-se um excelente secretário da Identidade e da Diversidade Cultural, afinado com o Sistema Minc", afirmou.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Jandira, Obama e o movimento estudantil

Enfim uma excelente notícia para o movimento estudantil do Rio de Janeiro. O novo prefeito do PMDB, Eduardo Paes, nomeou Jandira Feghali, do PCdoB, sua adversária no primeiro turno, secretária de Cultura do município. É uma pasta extremamente importante não apenas pela tradição do Rio em produção cultural, mas porque possui relativa independência em relação ao poder central e, o mais importante, movimenta um bom volume de recursos financeiros, o que permitirá à Jandira realizar políticas culturais que poderão realmente fazer diferença.

Jandira terá que lidar com um grande abacaxi: dar um destino ao elefante branco construído por César Maia, a faraônica obra Cidade da Música, que ainda tem contratos não pagos, e cujo orçamento, inicialmente estimado em pouco mais de R$ 30 milhões, já consumiu mais de R$ 500 milhões.

O aspecto positivo para a juventude e o movimento estudantil é que o movimento estudantil organizado, a UNE e UEE, cujos dirigentes também são quadros comunistas, têm um excelente trânsito junto à Jandira, de maneira que a pasta de Cultura, pela primeira vez em muitos anos, quiçá pela primeira vez em sua história, ficará nas mãos da esquerda.

Naturalmente, será um enorme desafio para Jandira, mas não podemos esquecer que a conjuntura política será bastante favorável, visto que a nova gestão municipal inscreve-se num quadro de estreita aliança com as instâncias estadual e federal.

Por outro lado, a nomeação de Jandira também constitui um movimento significativo no tabuleiro político fluminense, um gesto inteligente e generoso do novo prefeito, Eduardo Paes, para conquistar a confiança da esquerda. Recém-convertido à centro-esquerda, Paes fez o caminho contrário de seu oponente no último pleito, Fernando Gabeira, que deslocou-se à direita e aliou-se ao PSDB e ao DEM de César Maia. Em virtude de seu amplo leque de alianças, esperava-se que Paes fosse faturar com facilidade a prefeitura. Não foi assim. Inflado pela preferência explícita da midia e transformado em ícone da rebeldia juvenil, Gabeira chegou ao segundo turno e, durante os primeiros dias de campanha do segundo turno, ultrapassou Paes nas pesquisas.

Conforme explicou o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos, a esquerda carioca ficou encurralada num primeiro momento, porque Paes ainda carregava o estigma conservador, de parlamentar tucano, verdugo anti-lulista e midiático de CPI. Mas o candidato, forçado pelo risco da derrota, optou pelo que fosse talvez a única forma de ganhar as eleições. Em vez de aproximar-se de Crivella, e apelar para o lado mais populista (e conservador) da política estadual, Paes acenou para a esquerda politizada, à esquerda real. E a esquerda veio, exigindo, é claro, contrapartidas, como agendas progressistas para a saúde, educação e cultura.

Para a saúde, Eduardo Paes, embora não tenha aceito integralmente o programa de Jandira Feghali, de longe o mais completo dentre os candidatos, nomeeou para a pasta uma autoridade de grande prestígio e idoneidade, o médico cardiologista Hans Fernando Dohmann, que seguramente representa um avanço extraordinário em relação à política desastrosa de César Maia (DEM), que havia entregue a pasta ao PSDB, a Ronaldo Cézar Coelho, um banqueiro sem qualquer vivência na área da saúde, que levou o setor ao mais tenebroso caos.

Mas é a nomeação de Jandira Feghali para a pasta de Cultura o gesto mais claro de vontade política de Eduardo Paes de fazer aliança com a esquerda carioca e integrar-se verdadeiramente ao conjunto de forças reunidas em torno da figura simbólica do presidente Lula.

Jandira assume o governo num momento especial. Até agora, a esquerda, mesmo assumindo o poder em quase todos os países da América Latina, era considerada, pelas elites e mídias corporativas, uma espécie de epidemia ideológica passageira. Descontando o fato de que a "epidemia" em breve completará uma década, o continente acaba de vivenciar uma reviravolta geopolítica. O único ponto de apoio dos conservadores radicais que ainda infestam a política latino-americana, encastelados sobretudo na mídia corporativa, acaba de ser eliminado. A direita americana, quem diria, foi vencida por um negro. Um senador negro com histórico de atuação mais à esquerda do Congresso tornou-se presidente dos Estados Unidos da América. Os conservadores brasileiros - e de toda América Latina - vivem um pesadelo. Imaginem o que pensam os colunistas e apresentadores de tv da Bolívia e Venezuela, que chamavam Evo Morales e Chávez de "macacos". Agora terão que dizer o mesmo de Barack Hussein Obama.

É neste novo e emocionante ambiente geopolítico que devemos pensar e agir a partir de agora. A vitória de Obama deverá, aos poucos, contaminar ideologicamente o mundo inteiro, e o Rio não escapará dessa onda. Sempre é importante lembrar que a vitória de Obama só foi possível por causa do apoio maciço que obteve junto à juventude. Os movimentos estudantis norte-americanos alinharam-se integralmente à campanha do negro filho de imigrantes africanos.

Então chegamos ao movimento estudantil nacional. A UNE hoje está fortalecida, com mais recursos e, em breve, terá uma sede de primeiro mundo no Rio de Janeiro. É claro que isso representará um grande impulso à politização estudantil. Parte do desinteressse dos jovens pela política estudantil pode ser explicado pela precarização e abandono a que as instituições do segmento foram relegadas pela ditadura e depois pelos governos neoliberais. Vendo que suas instituições hoje são respeitadas e têm mais recursos, os jovens sentir-se-ão novamente atraídos e, com isso, esperamos inverter a tendência atual à alienação política que predomina entre a juventude. Essa tendência tem sido abertamente incentivada pela mídia, que nunca mostra jovens politizados em séries e novelas, e quando os mostra é num contexto negativo, caricatural ou passadista. Somente em filmes de época, os jovens vêem seus iguais pensando e agindo politicamente. Glamourizou-se a futilidade, que adquiriu inclusive veleidades de inteligência. Jovens conversam seriamente sobre desenhos e seriados infanto-juventis, como antes discutiam sobre cultura e política. E ainda tem o mais grave: esporadicamente, como se fosse "ativados" por força invisível, esses mesmos jovens, assumidamente anti-políticos, tornam-se ferozes militantes políticos! E quem ativa esse jovens? Quem pressiona-lhes o misterioso botão que lhes transforma subitamente em militantes furiosos que se alinham, não coicidentemente, às mesmas causas defendidas pela grande mídia? Ora, a própria mídia! Como isso acontece?

Bem, não sei bem como isso acontece, mas sabemos como libertar a consciência política do jovem, deixando que ele pense com sua própria cabeça e não conforme um artigo de Arnaldo Jabor. Política é como arte: aprende-se fazendo, participando, trabalhando. O jovem deve participar da política usando o talento que possui: na música, na poesia, na oratória, na dança, no teatro, no cinema. Glauber Rocha fez Deus e Diabo na Terra do Sul com 23 anos, o que mostra o potencial artístico, revolucionário, intelectual, que todo jovem possui, e que muitas vezes é mutilado ou atrofiado pela falta de treino.

A fortalecimento da União Nacional dos Estudantes já é uma realidade. O próximo passo é a consolidação das Uniões estaduais. Com esse objetivo, de revigorar a si mesma, ao movimento estudantil, e ajudar na reconstrução do pensamento político junto à juventude, a União Estadual dos Estudantes do Rio de Janeiro (UEE/RJ) está organizando a Bienal de Artes, Ciência e Cultura, a ser realizada nos dias 20 a 23 de novembro deste ano. Estamos recebemos mostras de arte e ciência e organizando shows, festas, apresentações, conferências e debates. As inscrições para as mostras e outras informações sobre a programação estão no blog da Bienal (http://www.bienalueerj.blogspot.com/). Convidamos todos, mesmo os que não são estudantes e não moram no Rio de Janeiro, a visitarem nosso blog, onde poderão assistir vídeos e ler textos sobre a Bienal e sobre o movimento estudantil, além de acompanhar a intensa vida cultural da cidade maravilhosa.


Por Miguel do Rosário, 33, jornalista, editor do blog da Bienal de Artes, Ciência e Cultura do Rio de Janeiro (bienalueerj.blogspot.com), e resposável pelo blog OleodoDiabo.blogspot.com.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Propostas do Coletivo de Cultura da UJS -“BOTA A CARA”- para o setor Cultural:

- AMPLIAÇÃO do ORÇAMENTO MUNICIPAL para a cultura. Luta pelo 1% do orçamento;
- A prefeitura deve AMPLIAR e REESTRUTURAR os espaços e equipamentos culturais;
- Criação e/ou ampliação do FUNDO MUNICIPAL DE CULTURA;
Implementação do programa “CULTURA VIVA – PONTOS DE CULTURA” em âmbito municipal. Fortalecimento da relação destes com as lonas culturais e escolas do nosso município;
- Aproveitamento dos espaços e prédios públicos ociosos para a AMPLIAÇÃO DE ESPAÇOS PÚBLICOS CULTURAIS;
- Implementação do CONSELHO MUNICIPAL DE CULTURA;
- Aproveitamento das PRAÇAS PÚBLICAS para atividades culturais, tais como: cursos de artes, equipamentos de jogos e estrutura para espetáculos e shows ao ar livre.Assim democratizaremos o fazer cultural da própria comunidade, além de estimularmos a reunião das pessoas,que hoje mantêm-se isoladas em suas casas e apartamentos.

O QUE É E PARA QUE SERVE O COLETIVO DE CULTURA NA UJS?

“Para organizar os jovens artistas, mas também para fomentar o grande debate sobre o papel da Cultura na construção de um novo projeto de país”. (Tese sobre o movimento cultural do 14° Congresso da UJS).

O Coletivo de Cultura tem que ser um coletivo de artistas e intelectuais da Cultura!!!

O Coletivo de Cultura "BOTA A CARA" da UJS é uma necessidade. Hoje diversos fatores, tais como: economia da cultura, capitalismo cognitivo, capital estético, micropoder simbólico precisam de um maior aprofundamento para nos ajudar a entender o que está em jogo na disputa de idéias. Nesta batalha encontramos o jogo de "luta de classes", caractrizado como "luta de idéias de classes".
Por isso, é necessário que os artistas filiados, militantes ou simpatizantes da UJS venham discutir e refletir sobre a situação contemporânea.Entretanto, precisamos também produzir nossa própria arte, lutar pela democratização dos meios de produção artísticos e midiáticos.Faremos seminários,cineclubes,cinejornais,intervenções urbanas, fanzines e muito mais! Aqui discutiremos políticas culturais para democratizar todas as leis e programas de governo para setor. Exigiremos do poder público e até mesmo do poder privado que cumpram com as suas responsabilidades, que não passem por cima da mei-entrada nos equipamentos culturais da cidade e que não elitezem a produção cultural, concentrada em nosso município na Zona Sul da Cidade. Queremos que as lonas culturais dos bairros do subúrbio carioca funcionem com qualidade!!!

Portanto, venha conosco para "fazer muita arte".Pois,como disse Che Guevara, " se o presente é de luta o futuro nos pertence".